
A “Festa da Vênus”, um evento memorável que ocorreu em 1745, na luxuosa residência do marquês de Bernières, ficou para sempre gravada na memória dos cronistas como um marco da decadência moral e artística da corte francesa durante o Reinado de Luís XV.
Imaginem, caros leitores, uma noite parisiense de verão, com as janelas abertas para a brisa fresca carregada pelo aroma das flores de laranjeira. Dentro da casa do marquês, porém, a atmosfera era de pura efervescência. Uma celebração em homenagem à deusa romana do amor, Vênus, se desenrolava em meio a jogos ousados, poesia erótica e esculturas que desafiam os limites da decência.
A Festa da Vênus foi concebida por Armand-François de Bernières, um nobre conhecido por seu gosto extravagante e sua reputação controversa. Ele era um patrono das artes e um homem de ideias libertinas, fascinado pelas teorias iluministas sobre liberdade individual e a busca do prazer. Para ele, a festa era uma oportunidade para celebrar a beleza, o amor livre e a ruptura com as convenções sociais da época.
Os convidados eram uma mistura peculiar de aristocratas, artistas, escritores, e até mesmo alguns membros da corte real, atraídos pela promessa de uma noite inesquecível. Dentre eles, destacava-se Madame de Pompadour, a favorita de Luís XV, cuja presença causou um rebuliço ainda maior entre os participantes.
A decoração da festa era digna dos sonhos mais ousados: paredes cobertas por tapetes orientais, jardins artificiais repletos de flores exóticas e esculturas clássicas que representavam cenas mitológicas de amor e prazer.
O centro da atenção era uma grande estátua de Vênus, desnuda e radiante, que se tornava ainda mais impressionante sob a luz das velas. Os convidados passeavam entre as esculturas, apreciando a música de um grupo de músicos talentosos e degustando iguarias refinadas preparadas especialmente para a ocasião.
A noite foi repleta de jogos sensuais e desafios poéticos com temas amorosos, que incentivam a expressão da sensualidade e do erotismo. Os participantes se entregavam aos prazeres da dança, do vinho e das conversas provocadoras, em um ambiente livre de julgamentos morais.
Porém, a libertinagem da Festa da Vênus não passou despercebida pelos olhares vigilantes da sociedade parisiense. A notícia da festa se espalhou rapidamente pelas ruas da cidade, transformando-se em um escândalo que atingiu até mesmo as salas do Palácio de Versalhes.
A crítica moral foi implacável. Os clérigos denunciaram a festa como uma blasfêmia contra a religião e um ataque aos valores tradicionais. A nobreza conservadora se horrorizou com a ousadia dos participantes, consideranddo-os libertinos irresponsáveis que desonravam a imagem da corte.
Os rumores de orgias e excessos sexuais na Festa da Vênus levaram à intervenção do rei Luís XV. Embora ele próprio estivesse presente em algumas ocasiões mais discretas da festa, a pressão pública o forçou a tomar medidas para conter a onda de escândalo que ameaçava seu reinado.
O marquês de Bernières foi repreendido publicamente por sua conduta imoral e a festa foi oficialmente condenada pela corte. Embora os participantes não tenham sofrido punições severas, a Festa da Vênus ficou gravada na história como um símbolo da decadência moral que se instalava na sociedade francesa do século XVIII.
A Festa da Vênus pode ser vista como um exemplo fascinante da tensão entre a tradição e a modernidade durante o Iluminismo francês.
Por um lado, ela refletia o desejo de liberdade individual e a busca por novas experiências sensoriais que caracterizavam os intelectuais iluministas.
Por outro lado, a festa também evidenciou as resistências conservadoras à mudança social e a força dos valores morais tradicionais na sociedade francesa.
A Festa da Vênus teve um impacto significativo na cultura francesa do século XVIII. Ela inspirou artistas, escritores e músicos, que incorporaram temas de libertinagem e erotismo em suas obras. A festa também contribuiu para a crescente polêmica sobre os limites da liberdade individual e o papel da moralidade na sociedade.
Em suma, a Festa da Vênus foi um evento controverso e memorável que capturou a imaginação de toda a França. Ela nos leva a refletir sobre a complexa natureza da vida social no século XVIII, com suas contradições entre tradição e modernidade, liberdade e repressão.